Sugou muitas
frutas em cima da árvore do Nonato sem dizer palavra. Foi-se embora correndo
com ares de novidade. Desembaraçou os cadarços do calçado para sujarem pelo caminho e poder tropeçar. Toda vez que pisava no cordão do tênis caia no chão e
ria por minutos. Levantava e seguia em frente. Assim que chegou à Padoca, pediu
um pão de sal e o pendurou na conta do padrasto. Perguntou ao Genival, que estava
no caixa:
- Onde estão
os cacos do vidro do prato que deixei cair outro dia e pedi que guardassem? Quero fazer lembrança.
Os clientes se
entreolharam sem compreenderem o menino. Praticamente todos pensaram que o guri
nasceu sem parafuso. Fazer lembrança de caco de vidro? Já o dono da padaria, em
silêncio, foi até a cozinha, pegou um saco cheio de cacos coloridos e deu ao
menino. O garoto agradeceu, amarrou os cadarços, porque não queria ter trabalho
de juntar os pedaços de vidro se caísse e despejasse os caquinhos pelo chão. Pôs-se
a correr o mais veloz que podia. Quando alcançou o córrego, viu os peixes
nadarem na água transparente.
O guri então tirou
a roupa, pegou o saco estufado de cacos, uniu-os no fundo do riacho de modo a
ilustrar uma serpente. Assim que concluiu o desenho, esperou anoitecer. A lua e
o céu estrelado iluminavam o riacho e faziam com que a serpente de vidro brilhasse. No
decorrer dos dias, a população do vilarejo vendo aquela imagem começou a
desenvolver a lenda do riacho da serpente-diamante, que brilhava nas noites estreladas. A lenda correu os anos, os cacos de vidro em forma de serpente,
com a correnteza, já tinham até se desmanchado no fundo do córrego. Mas a
história persistia a povoar o imaginário popular.
Ali estava a
lembrança construída pelo guri.
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