quarta-feira, 8 de maio de 2024

Respirar dentro d'água

 


 

O medo paralisava seu ventre. Estava náufraga no meio do nada azul esverdeado. Eram ela e uma boia, os demais já haviam submergido ao acidente. Sua cabeça era um turbilhão de pensamentos. Toda uma vida de poucas palavras e tentativa de sobrevivência ao cotidiano de dias pouco emocionantes estavam ali.

A presença da possibilidade de morrer sem ter feito nada de interessante de sua monótona vida a deixava com um nó no estômago. Resistia agarrada àquela boia, sua companheira. Olhou para o céu desesperada, tudo era cinza, a água se revolvia atordoada.

A esperança de que algo mudaria sua condição de náufraga estava se esvaindo no fato de estar só, de apenas ouvir os trovões, do terror do que estava ali embaixo de seus pés: um mundo novo de vida submarina. A exaustão tomou conta dela, adormeceu, seu corpo foi sugado pelo mar.

Desesperada pela falta de ar começou a debater-se dentro d’água. Seria mais uma que não voltaria viva dali. Seriam todos quantificados como mortos. Seu desespero por não se tornar número em uma tragédia, foi se transformando em contentamento, uma paz habitou seu corpo.

Seu medo foi sendo conduzido para um estado de plenitude, tudo se transformou em ar no meio do oceano, conseguia traduzir-se em ser humano na condição de peixe, voltou a respirar naquela imensidão aquática. Seus olhos ganharam vida que nunca tiveram, alcançavam ver ali embaixo, não se turvavam a água, tudo era vida, tudo era simplicidade, tudo era paz.

 

Um comentário:

  1. Parabéns, Hanna! Quanta sensibilidade você tem! Continue escrevendo e publicando. Logo terá material suficiente para um livro.

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